Os Vinte Anos: Uma crise silenciosa no feminino
- Karen Faria
- 2 de jul.
- 2 min de leitura

Aos vinte anos, muitas mulheres se encontram num limbo existencial: já não são adolescentes, mas também não se sentem plenamente adultas. É uma fase marcada por pressões externas e internas: a busca por independência, a cobrança por definições profissionais e afetivas, e a angústia de quem ainda não se reconhece no espelho da maturidade. Psicanaliticamente, esse período é um terreno fértil para conflitos inconscientes, onde as demandas da vida adulta colidem com resquícios da infância e da adolescência. Freud falava sobre o luto pela infância perdida, um processo que muitas vezes se intensifica nos vinte anos.
Para as mulheres, essa transição é ainda mais carregada de simbolismos sociais: há uma expectativa velada de que elas devem "se encontrar" rápido: no amor, na carreira, no corpo.
A psicanálise mostra que, quando essas demandas não são assimiladas pelo ego, surgem ansiedade e autossabotagem. A mulher que "não se decide" pode estar, na verdade resistindo a um modelo de vida que não a representa, mas que foi injetada socialmente como obrigação.
Lacan discute o "Ideal do eu" que nada mais é que aquela imagem internalizada de quem gostaríamos de ser. Nos vinte anos, a discrepância entre esse ideal e a realidade pode ser esmagadora. Muitas mulheres se sentem fraudes: não são experientes o suficiente no trabalho, não são seguras nos relacionamentos, não são donas de si. A frustração, aqui, não é só pessoal, mas social: vivemos numa cultura que romantiza a juventude, mas não prepara as mulheres para lidar com seus problemas. Na verdade, as trata como problemas e devemos nos “encaixar” o mais rápido possível.
Nessa fase, os relacionamentos muitas vezes se tornam campos de batalha inconscientes. A escolha de parceiros pode repetir dinâmicas familiares não resolvidas: a busca por figuras que confirmem velhas feridas (como o pai ausente ou a mãe controladora). A psicanálise diria que, sem elaboração desses traços, a mulher pode ficar presa em ciclos de sofrimento, confundindo dependência emocional com amor.
Os vinte anos não são difíceis por acaso: são o palco onde a singularidade feminina é posta à prova. A angústia dessa idade é, em parte, necessária: é o desmoronar de ilusões para que surja um eu mais autêntico e de certa forma é doloroso porque não tem mais alguém te falando o que fazer, fora as inúmeras pressões sociais.
A saída? Talvez não exista uma fórmula, mas a psicanálise sugere que a resposta está no enfrentamento desses conflitos, não na fuga (o que é difícil, vamos combinar). Aceitar não ter todas as respostas, questionar as expectativas internalizadas e, acima de tudo, reconhecer que o caos dessa fase não é fracasso, mas o primeiro movimento em direção a uma identidade verdadeira. Se há uma mensagem a ser extraída, é que os vinte anos são menos sobre "se tornar" e mais sobre "se desfazer". E, nesse processo, a dor não é inimiga, ela faz parte de um jeito ou de outro.
*Esse post é destinado a todas que se sentem perdidas aos vinte e aos vinte e poucos. (E eu sou uma delas). <3
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